Para chegar a tal conclusão, os cientistas
sequenciaram o genoma completo de milhares de partículas virais encontradas em
dez amostras de sangue de pacientes diagnosticados durante a epidemia que
atingiu a Baixada Santista em 2010. Na ocasião, foram notificados 33 mil casos
de dengue tipo 2 na região, ainda que os especialistas estimem que o número
real de infectados seja pelo menos cinco vezes maior.
De acordo com os resultados, a variabilidade
genética do vírus encontrada dentro de um mesmo indivíduo (intra-hospedeiro)
foi de aproximadamente 0,002% – muito menor do que a apontada em estudos anteriores,
contou Camila Malta Romano, pesquisadora do Instituto de Medicina Tropical de
São Paulo, da USP, e autora da pesquisa.
“Os trabalhos anteriores usaram métodos
tradicionais de sequenciamento, bem mais trabalhosos e caros. Por isso, apenas
uma determinada região do genoma era analisada e nem todas as partículas virais
eram amostradas. Em nossa pesquisa, graças às técnicas de sequenciamento em
larga escala, geramos praticamente uma sequência completa para cada partícula
de vírus existente na amostra, o que dá uma profundidade de análise muito
maior”, contou.
“Acreditava-se que a variabilidade genética do DENV
fosse muito mais alta pelo fato de ele ser um vírus de RNA, assim como o HIV (causador
da Aids) e o HCV (causador da hepatite C). Ao contrário dos vírus de
DNA, que usam o maquinário celular do hospedeiro para se replicar, os vírus de
RNA se replicam por conta própria. Isso significa que não há mecanismos de
correção de erros no processo e, por conta disso, é esperada pelo menos uma
mutação a cada progênie”, explicou a pesquisadora.
Uma das hipóteses dos cientistas para explicar a
menor variabilidade genética do DENV em relação aos outros vírus de RNA é o
fato de ele ter de se alternar entre dois hospedeiros muito diferentes –
mosquito e homem – para completar seu ciclo de transmissão.
“Do ponto de vista evolutivo, essa alternância
entre um vertebrado e um invertebrado exerce uma pressão muito forte para que o
DENV não mude muito. Se ele acumular muitas mutações, pode perder a adaptação
que o torna capaz de se replicar tanto no homem quanto no mosquito. Esse tipo
de mecanismo evolutivo já foi demonstrado para o vírus causador da febre
amarela”, disse Romano.
“O organismo não tem tempo para montar uma resposta
imunológica específica contra o vírus. É diferente do HIV, por exemplo, que
causa uma doença crônica, está em constante briga com o sistema imune e precisa
se modificar o tempo todo para driblar as defesas do organismo. No caso do
DENV, essa pressão seletiva é menor”, afirmou Romano.
Segundo o infectologista e imunologista Esper
Georges Kallás, professor da disciplina de Imunologia Clínica e Alergia da
Faculdade de Medicina da USP e coautor do estudo, as informações detalhadas
sobre o genoma do DENV obtidas no estudo poderão ajudar a identificar regiões
do vírus capazes de ativar uma resposta imunológica – o que abre caminho para o
desenvolvimento de uma vacina.
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